Publicado em 1960, "Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada" é o resultado das anotações que Carolina Maria de Jesus fazia em seus diários entre 1955 e 1960, enquanto vivia na extinta favela do Canindé, às margens do Rio Tietê, na cidade de São Paulo. Em seus diários Carolina expõe relatos da dura realidade em que vivia e reflete sobre as dificuldades enfrentadas diariamente pela sobrevivência em meio à extrema pobreza, fome, violência, corrupção política e preconceito social e racial.
Carolina foi uma mulher muito à frente de seu tempo: negra, independente, semianalfabeta, mãe solteira de três filhos pequenos — José Carlos, João José e Vera Eunice —, e sustentava a família trabalhando como catadora de papelão. Carolina nunca quis se casar, pois o que mais via em seu cotidiano eram mulheres sendo maltratadas por maridos preguiçosos ou violentos. Apesar das dificuldades, ela preferia enfrentar os obstáculos sozinha a se submeter a situações de abuso ou dependência, demonstrando seu desejo por dignidade e paz para criar seus filhos.
Mesmo com apenas o segundo ano do primário, Carolina tinha um profundo desejo pela educação e amor pela leitura. Ela encontrou na escrita um refúgio para se afastar do sofrimento e registrar suas experiências e reflexões. Suas palavras, embora frequentemente retratem queixas sobre a favela e as péssimas atitudes de seus vizinhos, possuem um toque de sensibilidade e uma linguagem poética que encanta o leitor.
A autora sempre demonstrou interesse em publicar um livro com os seus escritos, mas enfrentou diversas rejeições editoriais. Seu talento foi reconhecido quando o jornalista Audálio Dantas visitou a favela para escrever uma reportagem e se deparou com seus diários. O jornalista percebeu que os relatos de Carolina capturavam a essência da vida na favela de maneira mais poderosa do que qualquer matéria jornalística. A partir de então, trechos de seus escritos foram publicados em jornais como a Folha da Noite (1958) e O Cruzeiro (1959), culminando na publicação de Quarto de Despejo em 1960.
A escolha editorial de manter a escrita original de Carolina, respeitando a grafia e ortografia, permite ao leitor se aproximar da autora e de sua visão de mundo. A leitura flui rapidamente e em muitos momentos nos provoca reflexões profundas sobre privilégios e desigualdades.
O título do livro, Quarto de Despejo, é uma metáfora criada por Carolina de que as favelas representavam o espaço onde a sociedade "despejava" aqueles que julgava indesejáveis ou insignificantes.
A fome é algo que está presente em muitos momentos de seus relatos e quando ela atingia o limite do suportável, Carolina via a cor que a fome assumia para ela: amarela.
Carolina Maria de Jesus foi um fenômeno literário do século XX, Quarto de Despejo, traduzido para diversas línguas, alcançou grande sucesso quando lançado, mas infelizmente, seu nome caiu no esquecimento por décadas. Nos últimos anos, sua obra foi resgatada, tornando-se tema de estudos literários, linguísticos e sociológicos, com foco em valorizar a diversidade cultural e dar voz às narrativas marginalizadas.
Mesmo escrito na década de 1950, Quarto de Despejo é uma obra atemporal e essencial para compreender as desigualdades sociais e a força das histórias de resistência. Carolina Maria de Jesus nos leva a refletir sobre realidades que, infelizmente, ainda persistem, e sua voz continua ecoando como um chamado à empatia e à mudança.
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